quarta-feira, 6 de março de 2013

O tempo (parte 2 – A vingança)

Há ainda um outro fenómeno curioso - de entre a miríade de fenómenos particulares que é a própria meteorologia – que se produz, com especial incidência, sobre a psique humana, e que acho digno de atenção - trata-se de um certo tipo de transformação de personalidade, talvez uma esquizofreniazinha momentânea, derivada da pressão atmosférica: o orgulho que se gera em quem traz novas sobre as condições meteorológicas. Facto é que as pessoas adoram anunciar em viva voz coisas relacionadas com o tempo.

Vejam bem, que um amigo meu, ex-futebolista amador mas ainda não futebolista profissional, a melhor recordação que guarda da sua curta mas brava carreira, foi do dia em que se lesionou com gravidade num joelho, num lance disputado com um viril central do Arrentela. Porquê? Porque nesse dia perdeu uma rótula mas ganhou um infalível aparelho indicador de alterações climatéricas. “Disto nem o Mantorras tem, diz ele com orgulho lá no café do bairro enquanto é olhado com inveja despudorada por alguns dos seus pares que nunca tiveram tamanha sorte.
É por isso, que sempre que as condições climatéricas se alteram, as redes sociais se enchem de comentários do tipo “ai que está frio!”, “ ora bolas que por aqui já chove!”. O mundo fica atulhado de jornalistas do óbvio.

Este fenómeno tem ainda mais impacto se for ao vivo; estória verdadeira:

Escritório. Parte da tarde. Toda a gente, ou quase toda a gente, concentrada no trabalho. Caras nos computadores e, de repente, volta alguém da pausa para o tabaco e, qual Arauto Meteorológico, diz a plenos pulmões: “Pessoal, está a chover!”,

É o pânico, é o caos, é a tragédia!

Há gente a correr para as janelas a confirmar o evento. Há lamúria generalizada e catastrofista sob a forma de “oh não, eu não trouxe chapéu-de-chuva!”. Seguem-se as acusações, a atribuição de culpas: “ELES não deram chuva para hoje! Isto não se admite!”, agita-se a paz social do local de trabalho, acendem-se as índoles contestatárias e gera-se, em média, uma quebra da produtividade que poderá chegar a  níveis próximos do zero, durante pelo menos uns bons cinco minutos.

Afirmo até, talvez de forma temerária, de que é o superior interesse que temos pelas questões meteorológicas que nos trama...é por termos um clima melhor, mais rico e mais diversificado, que a nossa produtividade é inferior à dos países do Norte e Centro da Europa - só pode.

Se aqui estivesse permanentemente a fazer frio, a chover e a nevar, e se não tivéssemos que estar constantemente preocupados como tempo que faz lá fora, era fácil produzir mais e melhor!

Eslavos d´um raio!! Assim também eu!! Experimentem lá vocês produzir, sabendo que de repente o sol deu lugar a farrapos e a qualquer momento podem surgir aguaceiros! Queria-vos ver a conviver com esta angústia!

P.s.: enquanto escrevia este texto a minha mãe ligou-me. Antes de me dizer que tinha feito boa viagem e chegado bem ao seu destino, fiquei a saber que estava chuva e vento por lá.


*O PIP orgulha-se de dizer, que este texto foi escrito em parceria com a Sara Krussman Taborda

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