quinta-feira, 28 de março de 2013

E ao segundo ano, ressuscitou.

Não me espantava nada que, um dia, alguma entidade pública deste país, invocando a similitude das situações, propusesse para este Sócrates o mesmo fim do seu homónimo grego.

O motivo é simples. O filósofo pariense tem um carisma insuperável no espectro da política nacional, tornando praticamente impossível que alguém lhe fique indiferente. Ao contrário de Pedro Passos Coelho que, por pior que nos faça, nem odiado consegue ser, porque para isso é preciso ter-se uma personalidade forte e uma aura que este claramente não tem (já Miguel Relvas...). O anterior primeiro-ministro, com a sua maneira de ser, bipolariza, de forma única, os sentimentos que lhe são dirigidos. Sócrates ou se ama ou se odeia.

Os que o amam, fazem-no por razões que eu e a própria razão desconhecemos e nem queremos que nos digam. Os que o odeiam, odeiam-no sobretudo por uma razão: medo. Puro e simples, nada de muito complexo, medinho.

Sócrates provoca calafrios a uma certa ala da população portuguesa. Passados dois anos do seu abandono do país, decide falar à nação e tem mais audiência que as entrevistas do primeiro-ministro e do ministro das finanças juntas, e com um bónus: ontem ninguém adormeceu. Como fazê-lo? Goste-se ou não, o estilo é vibrante. Os jornalistas, na sua mão, transformam-se em meros joguetes acessórios. Os mais cépticos tornam-se crentes. E uma mera entrevista torna-se um comício, como que por magia.

Ontem, antes, durante e pouco depois do ex secretário-geral do PS falar, as redes sociais tiveram um “boom” de comentários sobre o assunto, quase todos eles feitos pelos seus detratores. Tive amigos que estiveram mais activos no facebook do que o Presidente da República em tempos de crise (por falar nisso, estou muito ansioso pelo seu próximo prefácio). Vi a entrevista com um deles. Ele estava tão nervoso que me senti forçado dar-lhe a mão, apenas para o pobre coitado conseguir aguentar ver aquilo ate ao fim. Que suplício.

No fim tremia e garantia-me que sabia que ele tinha planos secretos que não revelava. Queria a presidência, queria São Bento de novo, queria a Câmara de Faro e a Junta de estarreja. Queria o lugar dele na empresa, as chaves do carro para dar uma volta e o mail da namorada para a adicionar ao facebook. Abracei-o, garanti-lhe que estava tudo bem, que ele tinha dito que não queria nada. Foi em vão. Garantiu-me que tinha visto nos seus olhos que ele queria tudo aquilo e mais uma ou outra coisa que não revelava, para que não achassem que era louco. Reconfortei-o e limpei-lhe o suor que escorria, em bica, da testa.

O terror que a personagem inspira é de tal ordem que, dizem, na Lapa há mães que se servem dele para ameaçar os seus rebentos e levá-los a comer: “Be’nardo, coma a sopa toda, ó vem aí o Sócras out’a vez”, e é ver os petizes pegarem na terrina de asa dupla, com ambas as mãos, sem cautela, sorvendo a Vichyssoise com sofreguidão e maneiras que faziam corar qualquer Paula Bobone. O respeitinho é uma coisa muito bonita. O medo é uma coisa muito séria.

Este medo é ainda maior uma vez que, sendo véspera de Páscoa, os que contavam com uma cruxificação pública vão ter que se contentar com as imagens que chegam das Filipinas. Em termos religiosos, aquilo a que assistimos ontem foi algo entre um lavar de mãos à Pôncio Pilatos e uma ressureição, ainda mais impressionante que a original, porque desta vez não passaram três dias, mas sim dois anos desde o presumível óbito.

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